terça-feira, 13 de outubro de 2009

ENTERRAR O CORAÇÃO


Onde dormem as gaivotas? Onde dormem os cães vadios? Onde dormem os loucos, os sós, os sem abrigo, os que não dormem? Onde dormem os fantasmas, os vampiros, os demónios e as memórias? Onde dormem os sonhos e os pesadelos?
Os dias correm claros e luminosos, mas á noite, quando as crianças têm medo do escuro e os adultos se encolhem no sofá, onde estão as gaivotas, os cães, os loucos?
Eu tenho uma teoria! Acredito que, como nunca somos só e sempre a mesma pessoa, á noite nos transportamos para outros corpos e seres e somos nós os cães, os fantasmas, os poetas, as gaivotas.
Digo isto porque acordo todas as noites alagada em suor, depois de me ter perdido em cidades que nunca vi mas que tenho a certeza que existem.
É nos meus sonhos que percebo que afinal não sou nem quem penso que sou, e muito menos quem gostava de ser. Não passo de uma rapariga escondida numa concha que não sei abrir, e é por isso que sonho que tenho outra vida, que sou um cão ou um passaro, que sou um louco ou um poeta. Ao menos esses correm, voam, sonham, sofrem e desejam. Ao menos esses procuram sempre qualquer coisa, em vez de enterrar o coração e enganar os dias numa existência perfeita e intocável, onde ninguem entra, onde o mundo só serve para contemplar e a agua das fontes é sempre para os outros.

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